(1) Botsuana rompeu (em 1966) a tradição (colonialista) do desvio do dinheiro público em favor do enriquecimento privilegiado de uma elite (política e empresarial) que comandava o poder; hoje é uma democracia mais efetiva que o Brasil (posição 28, contra nossa posição 51), é menos corrupta que o Brasil (posição 28 no ranking da Transparência Internacional, contra a posição 76 do nosso país; nota 63, contra 38) e tem maior renda per capita (US$ 17 mil contra US$ 11 mil); um nome relevante, ligado a essa revolução, foi o de Seretse Khama (que foi o líder da independência, em 1966, e que trabalhou – como presidente – honestamente e proficuamente);
(2) Não se pode comparar um país pequeno como Botsuana (pouco mais de 2 milhões de habitantes) com o Brasil (com mais de 200 milhões de habitantes). A questão não é comparar, sim, analisar os fatores do sucesso deles e verificar o quanto é possível fazer de forma diferente, sublinhando-se a honestidade do governo assim como a expulsão da classe empresarial das tetas do Estado, lançando-a ao mercado capitalista competitivo; quem quer se enriquecer empreendendo que vá para o mercado competitivo e que não fique parasitando o dinheiro público (ou “comprando” medidas provisórias ou buscando monopólios ou oligopólios etc.);
(3) Sem ruptura com as estruturas de poder extrativistas e corruptas (agentes públicos e elites empresarias corruptos) o Brasil não mais sairá do círculo vicioso de baixo crescimento e de miséria em que se encontra;
(4) Nosso espírito tem que ser dos mosqueteiros: somar nossas energias para juntos promovermos uma profunda reforma do sistema político-eleitoral por meio de um plebiscito seguido de lei ratificadora obrigatória;
(5) Temos que lutar pelo “recall” (destituição do governante incompetente ou desonesto), pela diminuição do número de parlamentares, pelo fim das mordomias, pelo fim do foro privilegiado nos tribunais, pela cláusula de barreira, pelo fim das coligações nas eleições proporcionais, pelo barateamento das campanhas eleitorais (usando os meios digitais) etc.
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A questão central (que vale a pena insistir exaustivamente) é que sem ruptura incisiva com o padrão contingente histórico expropriatório, tal como a feita pela Lava Jato em relação à corrupção dos agentes públicos (oligarquias) e das elites empresariais desonestas bem posicionadas dentro do Estado, eterniza-se o círculo vicioso do patrimonialismo e do capitalismo de compadres (carteis) assim como da concentração dos recursos públicos predominantemente nas mãos das oligarquias/elites políticas e econômicas extrativistas – digamos que sejam 1%, em detrimento dos 99% restantes.
Botsuana (que não está banhada por nenhum mar e fica colada na África do Sul, na Namíbia e no Zimbábue), pelas suas condições históricas e regionais (foi colônia da Inglaterra de 1885 a 1966), tinha tudo para não se notabilizar; vem, no entanto, surpreendendo pela sua organização institucional não extrativista (daí seu enorme distanciamento para melhor dos demais países da África subsaariana).
No “Índice Democrático 2015”, da revista britânica The Economist (8ª edição), a democracia de Botsuana ocupa a 28ª posição, enquanto o Brasil está no 51º lugar. Foram analisados 165 países e dois territórios (que abarcam a quase totalidade da população mundial), centrando-se a atenção nos seguintes fatores: (a) processos eleitorais e pluralismo; (b) liberdades civis; (c) funcionamento do governo; (d) participação política e (e) cultura política. Tudo isso somado e escrutinado deu o resultado anunciado: posição 28 para Botsuana e 51 para o Brasil.
O Brasil, que tem tudo para ser muito mais do que é (pelo seu potencial de recursos naturais e humanos e pela sua riqueza), sem outras rupturas superadoras (= disrupções), que complementem a surpreendente microrrevolução da Lava Jato, jamais alcançará a linha de ascensão progressiva e sustentável conquistada pela Inglaterra a partir de 1688 (Revolução Gloriosa), pelos EUA a partir de 1776-1781 (Revolução da Independência), pela França a partir de 1789 (Revolução Francesa), pelo Japão a partir de 1868 (Revolução Meiji), pela Coreia do Sul a partir de 1961 (Revolução na Educação) assim como pela pobre e inusitada Botsuana a partir de 1966 (Independência da Inglaterra com implantação de padrões institucionais inclusivos que combatem especialmente a corrupção dos donos do poder).
Já vimos em postagem anterior que Botsuana está na 28ª posição do ranking da corrupção, contra a 76ª posição do Brasil. Botsuana possui um governo (oligarquias) e elites empresariais (bem posicionadas dentro do Estado) muito menos corruptos que nosso país.
É preciso entender a dimensão institucional da questão, que vai muito além das brigas e disputas partidárias (que chegam a gerar desavenças até mesmo em pessoas da mesma família). Não temos que nos dividir, sim, mosqueteiramente nos juntar (como, por exemplo, agora, em torno de um plebiscito libertador com lei ratificadora obrigatória). Os inimigos do país, do empreendedorismo, da inovação e da prosperidade sabem muito bem que é preciso “dividir para governar” (e para surrupiar, saquear os recursos públicos). Não temos que fazer esse jogo da divisão quando o assunto é o presente e o futuro do país.
O problema é profundo e é sistêmico: vivemos numa klpetocracia de quase 200 anos, totalmente viciada. Os partidos tradicionais fazem parte desse sistema maculado (veja as delações de Sérgio Machado e das empreiteiras assim como as provas da Lava Jato), que promove a locupletação favorecedora de uns poucos (oligarquias/elites políticas e econômicas bem posicionadas dentro do Estado), em detrimento dos muitos.
Em todos os momentos paradigmáticos citados de ruptura com padrões extrativistas foram defenestradas as diretrizes impostas pelas oligarquias governantes e elites empresariais que espoliam os recursos públicos da nação em benefício delas, enriquecendo-se pela corrupção, pelo favorecimento político perverso ou por meios absurdamente monstruosos (escravidão, por exemplo).
É evidente que Botsuana não é um paraíso escandinavo, mas é inegável que sua caminhada rumo ao desenvolvimento estável está sendo construída em bases mais sólidas que as demais nações africanas. E é isso que importa aqui sublinhar. Botsuana continua pobre e com alto índice de AIDS (apesar do seu exitoso e recente programa de combate à enfermidade), mas já passou o Brasil, por exemplo, no item da renda per capita. Mais: a evolução no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de Botsuana tem sido prodigiosa: com 0,561 no ano 2000, alcançou 0,698 em 2014. Crescimento muito superior (no mesmo período), que o melhor do Brasil em termos socioeconômicos (que de 0,731 em 2000 passou para 0,755 em 2014) (ver índice do IDH). A expectativa de vida que era de 47,1 anos em 2000, já pulou para 64,5 em 2014. A do brasileiro cresce menos velozmente (foi de 70,6 em 2000, para 75,2 em 2014).
Em outras palavras: Botsuana, apesar da sua pobreza, está criando condições políticas e econômicas inclusivas de desenvolvimento humano com resultados rápidos (por causa da extraordinária melhoria nos indicadores da educação – mais de 8 anos na média, contra 7,2 do Brasil -, da renda per capita e da expectativa de vida); o processo botsuanês (de desenvolvimento), não obstante todas as dificuldades inerentes aos países reconhecidamente pobres, tem sido muito mais célere que o brasileiro (e mais estável). Conta muito a questão da estabilidade institucional, item em que o Brasil sempre foi muito capenga.
Por meio da disciplina fiscal e de uma boa gestão, Botsuana transformou-se de um dos países mais pobres do mundo a um país de renda média com um PIB per capita de US$ 17.700, em 2015 (conforme informação da CIA). Dois dos principais serviços de investimento classificaram Botsuana como o melhor risco de crédito na África.
Guardadas as devidas proporções (nunca é o caso de nos compararmos com outros países, sim, de copiarmos seus processos de ruptura com o atraso), Botsuana (país pequeno e paupérrimo, que tinha renda per capita de US$ 70 quando da sua independência, em 1966) está saindo da pobreza e do subdesenvolvimento de forma mais rápida e mais sustentável que o Brasil (que é um país rico – uma das 10 maiores riquezas do planeta –, mas que vive no atoleiro do atraso e do subdesenvolvimento em virtude, sobretudo, do extrativismo reinante na distribuição dos recursos públicos).
Um país que tinha tudo para não ser notável (nem notado), ou, no melhor dos casos, igual a praticamente todos os países da África Negra (Namíbia, Mali, Nigéria, Zimbábue, Serra Leoa, Nepal, Congo, Etiópia etc.), vem surpreendendo o mundo com crescimento econômico sustentável (há períodos decenais com crescimento de 10% ao ano). O Brasil tinha PIB per capita em 1975 de US$ 4.827, contra US$ 6.462 de Botsuana (note-se que seu PIB per capita em 1966 era de US$ 70). Em 2014 a renda per capita do Brasil era de US$ 11.384, contra US$ 16.099 de Botsuana. Em 2015 o país africano já atingiu a casa dos US$ 17 mil, contra os mesmos US$ 11 mil do Brasil.
Ou seja: apesar de toda crise mundial, Botsuana está conseguindo crescer consistentemente; nós, ao contrário, agora estamos em recessão (PIB de -3,8% em 2015), sem data certa para sair desse lamaçal (porque a instabilidade política decorrente da kleptocracia investigada e punida produz desconfiança na economia e essa descrença não incentiva o investimento nem a produção).
Onde está a diferença?
No seguinte: há países em que as oligarquias/elites políticas e econômicas canalizam os recursos públicos para o bem-estar de poucos (digamos: 1%), enriquecendo-se sobretudo por meio de uma vergonhosa corrupção sistêmica ou de forma politicamente favorecida ou de maneira absurdamente monstruosa, como é o caso do trabalho escravo; outros países adotam políticas e modelos econômicos não extrativistas, ao contrário, inclusivos, pluralistas, com oligarquias/elites que pensam no todo, não somente nelas.
O peso da história de cada país conta muito, mas não existe nada pré-determinado (não há determinismo histórico insuperável). É sempre fundamental saber, no entanto, se o grupo dominante que conquista o poder (e o Estado) organiza as instituições políticas e econômicas pensando em dividir o orçamento público em favor deles ou de toda nação. Sarney, Renan e Jucá, citados nos áudios de Sérgio Machado, estão pensando neles ou na nação? Em todos esses clássicos políticos de todos os tradicionais partidos não se consegue encontrar um Seretse Khama (que fez a grande revolução em 1966). Daí as formas diferentes de desenvolvimento que vemos nos vários países.
Se os recursos públicos só beneficiam as oligarquias/elites políticas e econômicas extrativistas e corruptas, é óbvio que o país terá baixo crescimento econômico, analfabetismo, estradas esburacadas, hospital sem remédio etc. Erro crasso é defender os interesses desses parasitas do poder, que inescrupulosamente sugam os recursos públicos como se fossem propriedades deles.
Tanto o Brasil como Botsuana foram colônias (de Portugal e da Inglaterra, respectivamente). Mas existem duas diferenças marcantes:
(1) Botsuana, mesmo antes do início da sua colonização (1885), contava com tribos que tinham instituições políticas inclusivas, assembleias gerais para deliberar os principais assuntos, centralização administrativa, procedimentos decisórios coletivos e pluralistas (Acemoglu e Robinson, Por que as nações fracassam, p. 315); no Brasil nossas instituições políticas e econômicas sempre foram extrativistas e patrimonialistas, posto que programadas para pilhar os recursos públicos, enriquecendo-se de forma normalmente corrupta, mas também por meio da picaretagem e do embuste, alcançados em razão da preponderância das suas relações privilegiadas dentro do Estado, de onde emergem as sociedades perversas.
(2) Botsuana corajosamente rompeu o padrão colonial extrativista em 1966 e isso nunca aconteceu no Brasil, seja na Colônia ou no Império, seja na República ou nas ditaduras: sempre fomos conduzidos por um único padrão de governança, extrativista, patrimonialista e corrupto, que incentiva o enriquecimento concentrado por meio de rapinagens impunes ou por formas politicamente favorecidas. Mesmo nos momentos de políticas passageiras e marginais de inclusão (Vargas e Lula, por exemplo), o exercício do poder assim como a divisão dos recursos públicos no Brasil nunca deixou de ser extrativista (saqueador), patrimonialista (confusão do público com o privado) e corrupto.
É esse círculo vicioso assim como a tendência de encarar os acontecimentos históricos como consequências inevitáveis e insuperáveis que temos que romper. Se a matriz (Portugal) está conseguindo se desvencilhar da “herança histórica maldita” (hoje ele ocupa a 28ª posição no ranking da Transparência Internacional sobre a percepção da corrupção), por que não seríamos nós competentes para fazer a mesma coisa?
A roubalheira – isso que a cabeça medíocre deveria entender – não é só do político A ou B: é do sistema. Todas as oligarquias picaretas saídas dos clássicos partidos, juntamente com as elites econômicas extrativistas mancomunadas com elas, estão nos roubando e roubando o futuro do país. Nesse contexto, não temos que lutar entre nós – afinal estamos todos pagando a conta da locupletação das oligarquias/elites parasitárias dos recursos públicos, sim, contra quem está surrupiando o dinheiro público como se fosse privado, contra quem está se enriquecendo com empréstimos subsidiados fornecidos cordialmente aos amigos ou sem critérios transparentes, contra quem está ganhando isenções fiscais na base da propina etc.
As oligarquias/elites políticas e econômicas sanguessugas do dinheiro público estão em conluio, há quase 200 anos, para perpetuarem as estruturas institucionais vigentes (políticas, econômicas, jurídicas e sociais), que assegurem em benefício delas o enriquecimento impune e corrupto ou politicamente favorecido (capitalismo de compadrio, de laços ou de cartéis).
Os barões ladrões das receitas públicas estão na nossa cara e é mais do que visível que eles, mafiosamente, estão reunidos num mesmo clube, o da kleptocracia. Logo, todo nosso esforço tem que se dirigir para a remoção desse obstáculo cancerígeno e institucional: uns poucos se apoderam do Estado e fazem todas as manobras possíveis para o enriquecimento deles (digamos que sejam 1%), em detrimento absoluto dos 99% restantes.
Novas microrrevoluções como a da Lava Jato devem acontecer por iniciativa da sociedade civil. Urgentemente, uma ampla reforma político-eleitoral por plebiscito libertador com lei ratificadora obrigatória. Nós é que temos que decidir o que queremos e depois o Parlamento aprova em lei o que foi deliberado pelo povo.
Temos que ser firmes contra todas essas picaretagens das oligarquias/elites políticas e econômicas extrativistas (que envolve agentes do Estado e do Mercado). Eliminá-las (por longo tempo) do jogo político e econômico é uma necessidade, sem prejuízo do processo penal e dos ressarcimentos devidos. Mais que isso: rompimento. Ruptura com o passado nefasto de espoliação, expropriação e corrupção em torno do erário. Mosqueteiramente temos que nos reunir em torno de projetos que viabilizem um novo Brasil. Não queremos sair do Brasil, sim, queremos um país diferente.
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