Uma dúvida contumaz dos que iniciam na advocacia criminal e, quiçá, o maior temor entre os profissionais da defesa técnica, tem relação com as primeiras sustentações nos Tribunais, essencialmente nos minutos que antecedem o julgamento meritório do habeas corpus.
Para alguns, em tempos menos difíceis, essa ação autônoma de impugnação já foi rotulada como remédio heroico ou verdadeira ação popular de garantias, a penal popular, diante sua ampla legitimidade para impetração e objeto de cognição. Um instrumento bélico contra ataques teratológicos à liberdade de ir, vir e ficar sem restrições ilegais.
Vemos que, no momento processual contemporâneo, os Tribunais Superiores impõem inúmeras restrições ao cabimento de tal via impugnativa, entre estas a impossibilidade do habeas ser sucedâneo da via ortodoxa recursal, como Recurso Ordinário Constitucional, Recurso em Sentido Estrito, Apelação e Agravo em Execução.
Os primeiros minutos de explanação devem se concentrar na possibilidade de conhecimento da medida, afastando uma supressão de instância ou mesmo o cabimento de uma medida recursal in casu, por exemplo, pela mora no processamento dos recursos convencionais.
Nos tribunais de 2º grau essa tarefa ficaria, em tese, mais facilitada, diante a inexistência de medidas com natureza recursal para guerrear decisões que decretam a prisão preventiva ou mesmo eventual excesso de prazo que caracterize a perpetuação desta.
Nessa perspectiva, tendo, somente, um quarto de hora para conclusão de suas alegações, cumpre enfrentar, prima ratio, o objeto da pretensão revelando no que consiste o constrangimento ilegal à liberdade ambulatorial.
Ainda que o exíguo tempo demande um critério objetivo, será importante realizar um silogismo jurídico-processual capaz de entregar uma musculatura teórica aos seus argumentos, adaptável ao Tribunal em que o impetrante se encontra.
Por certo, em alguns colegiados de segundo grau e, especificamente, em determinadas turmas, os discursivos dogmáticos podem ser adaptados, há desembargadores que desconhecem a doutrina de ROXIN, JAKOBS ou no plano procedimental, de GOLDSCHMIDT. Podemos apresentá-los, mas sem constrangê-los. É preciso saber lidar com essa literatura e com o jogo libertário.
Os pontos interdisciplinares e literários constituem a cereja do bolo fático, os quais não podem conduzir o defensor a um plano teórico sem retorno, onde a sustentação se torne um fim em si própria, um monólogo para demonstração de conhecimento. Por um lado.
Em outro plano, perceber o quanto é tênue a linha que separa o mérito da pretensão acusatória dos pressupostos que caracterizam as medidas acautelatórias e, qualquer mergulho profundo no oceano probatório, para atestar a inocência do réu, em regra, não é recepcionado com simpatia pelos componentes da Turma.
De maneira perfunctória, podemos explorar a prova (pré-constituída) no habeas corpus, já que, constantemente a gravidade concreta (e abstrata) são elementos para propiciar a denegação da Ordem e manutenção da privação excepcional. É o que se faz quando se demonstra a inexistência de indícios suficientes de autoria para decretação e manutenção da prisão. Não há fumaça do delito capaz de legitimar um encarceramento provisório que não se perpetuará ou concretizará ao final da instrução.
A alegação de excesso prazal é um fundamento contumaz para relaxamento de custódias despidas de legalidade. Deve ser ventilado que o processo penal tem o seu tempo, e não se persegue uma velocidade como a existente nas relações sociais contemporâneas energizadas pela internet, é preciso plantar a semente para colher o recorte da realidade que é objeto do feito, pois o crime é rápido, mas o procedimento penal deve ser duradouro, sem atropelos que possam sangrar as garantias individuais.
Entretanto, o tempo objetivo deve ser respeitado, evitando dilações desproporcionais, e uma perpetuação de persecuções criminais que, por vezes, sequer se iniciaram ao tempo de sua sustentação. A razoabilidade é o escudo comum para legitimar a duração (ir) racional do processo, então é relevante usufruir de discursos quanto a ausência de responsabilidade defensiva no excesso temporal evidenciado. Ademais, a deficiência estrutural do Estado no cumprimento dos prazos processuais afasta a responsabilidade subjetiva do magistrado, mas não obsta a necessidade de relaxamento da segregação.
De se notar, que a existência de tempo exorbitante, pode se configurar mesmo quando não executado o mandado prisional, em uma hipótese de “fuga legítima”, não sendo o imputado encontrado para execução do decreto. O preso de direito, também tem a sua liberdade de locomoção cerceada, e não se pode sujeitar a alegação do excedente temporal ao encarceramento fático-corporal. O processo criminal se apresenta como um constrangimento mesmo quando inexistente a privação processual. Existe o tempo objetivo, calendário, e o subjetivo, que é a projeção da personalidade sobre o lapso temporal, esses ensinamentos de Einstein afastam a ideia de que o juiz possa ser um relojoeiro processual, decidindo o tempo razoável para conclusão do feito.
Quanto a (des) necessidade da ultima ratio, esse é um ponto fulcral das maiorias dos habeas corpus recebidos e processados pelos Tribunais. Existe uma tempestade de pedidos afastados com uma cláusula guarda-chuva, denominada ordem pública ou econômica. Como esse requisito é recepcionado pela maioria dos Colegiados nos casos de gravidade in concreto, e risco de reiteração criminosa, concentrem-se em guerrear esses dois pontos, mas demonstrando a inexistência de um elemento empírico para justificar uma prisão que é excepcional.
O preceito da homogeneidade, mediante obter dictum, pode colaborar para a concessão da Ordem, principalmente nos casos em que a primariedade, bons antecedentes e circunstâncias pessoais favoráveis contribuirão para a imposição de uma sanção ínfima, quando a reprimenda corporal não se concretizará, ao menos em regime fechado. Não se pode encarcerar no passado, manter no presente para soltar no futuro.
Nessas etapas de referência, importante atacar as omissões e ambiguidades das informações prestadas pela autoridade coatora, demonstrando os equívocos dos informes, pois o Colegiado, em alguns casos, aplica o famigerado princípio da (des) confiança no juiz do feito.
A declinatória é um primeiro passo de um célere procedimento, nesse jogo processual, não se pode abandonar o habeas após o ofertamento da exordial, os elementos probatórios novos que surgirem no curso processual devem ser aditados aos autos, para constituição da prova de sua alegação. Essa ação autônoma de impugnação também é processo penal, uma situação jurídica, onde há liberação de cargas (GOLDSCHMIDT), e o ônus de comprovar o teor da manifestação (infelizmente) é do impetrante.
Em arremate, devemos conceber a sustentação oral, nos primeiros encontros, para os que iniciam na advocacia criminal, como uma conversa formal, sem devaneios verborrágicos e semânticos, com uma objetividade técnica e apoio na prova do pedido liberatório, capaz de atrair a atenção, admiração e deferimento dos julgadores.
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